Investigações da Polícia Federal apontam que donos de garimpos ilegais na Amazônia comandavam as operações mesmo de fora do país. Agentes da corporação identificaram o esquema após seguir os passos e as transações financeiras do empresário e químico Antônio Oliveira, o Pimentel, preso em novembro de 2023 ao ser deportado dos Estados Unidos.
Em Massachusetts, ele recebeu ao longo de 2022 pagamentos de R$ 4 milhões relacionados aos garimpos de ouro do “Filão dos Abacaxis”, em Maués, no Amazonas. A área foi descrita por um garimpeiro ouvido pela PF como “a mais lucrativa de toda América Latina, sendo o sonho de todo garimpeiro atuar na região”, conforme relatório policial obtido pelo GLOBO.
A PF o aponta como um dos principais chefes de garimpos da região desde a década de 1990, quando ele começou a fazer pesquisas no local, descobriu vestígios primários de ouro e abriu uma mineradora.
Procurada, a defesa de Pimentel afirmou que ele foi aos Estados Unidos para “realizar um tratamento de câncer de próstata” e não como foragido. E enfatizou que ele não controla mais nenhum garimpo na Amazônia, porque “as terras haviam sido repassadas para outra pessoa”.
Pimentel foi alvo de uma operação da PF em abril do ano passado. Um mandado de prisão foi expedido, mas ele já se encontrava nos Estados Unidos. O nome dele, então, foi incluído na lista de difusão vermelha da Interpol. A PF o indiciou pelos crimes de usurpação, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
No mês anterior, ele já havia sido condenado a cinco anos e seis meses de prisão por usurpação de bens da União pela Justiça Federal do Amazonas, com o direito de recorrer da pena em liberdade. A sentença afirma que ele tinha “ascendência aos garimpeiros (real hierarquia sobre os demais envolvidos na extração criminosa do ouro), com poder de mando a operadores de máquinas, garimpeiros, trabalhadores do laboratório do garimpo”.
Parcelas milionárias
Em 18 de novembro do ano passado, Pimentel acabou sendo deportado dos Estados Unidos porque o seu visto estava desatualizado. Ao desembarcar no Brasil, foi detido pela PF no aeroporto de Manaus.
Conforme as investigações, ele morava com a família nos EUA desde setembro de 2022. No total, recebeu R$ 4 milhões por meio da conta de uma enteada. O autor das transferências era um sócio dele no ramo do garimpo.
“O pagamento foi feito de R$ 500.000,00 de seis em seis meses, ou seja, ficou com a área (de garimpo) por uns 4 anos”, explicou o sócio à PF.
A enteada de Pimentel disse aos investigadores que “não sabia a profissão” do padrasto e confirmou que recebeu os valores referentes à compra de “posse de umas terras”.
Por meio de uma chamada por videoconferência dos Estados Unidos, Pimentel também prestou esclarecimentos à PF, em maio. Na sessão, ele foi informado que havia um mandado de prisão contra ele. E explicou que recebeu R$ 2 milhões pela “posse da região”. Segundo ele, no passado, realmente “tomou conta” de três áreas de garimpo do “Filão dos Abacaxis”, mas que “desempenhava apenas pesquisa e procurava investidores para o local, nunca chegando a realmente extrair ouro da região”. A PF refutou essa afirmação, dizendo que “análises periciais confirmam que o lugar sempre foi garimpado”.
A região dos Abacaxis é de difícil acesso e se situa na floresta de Urupadi, área de preservação sob a guarda do ICMBio, que sempre foi marcada por conflitos entre os chefes que a reivindicavam. Em março de 2023, agentes do ICMBio e da Força Nacional fizeram uma batida nos garimpos do “Filão dos Abacaxis” e se depararam com um agravante — “o uso de cianeto para beneficiar o minério”, segundo apontou o relatório da PF. A substância tem a mesma função do mercúrio de separar o ouro do solo, mas é considerada letal para o homem se utilizada em grande quantidade. Nesta mesma operação, houve duas prisões de “seguranças” dos garimpeiros, que contaram ter recebido R$ 6 mil para resgatá-los, além da apreensão de armas.