Garimpeiros que continuam na Terra Indígena Yanomami, em Roraima, deslocaram hubs — centros de distribuição de equipamentos, combustível e alimentos — para territórios da Venezuela como forma de driblar a fiscalização. As informações são do UOL.
Esses centros servem como pontos de apoio no meio da mata. Os hubs estão localizados em áreas próximas às pistas para voos clandestinos abertas na região de fronteira entre os dois países.
Imagens de satélite mostram pistas de aeronaves e centros de distribuição em território venezuelano. O Instituto Socioambiental e a Associação Hutukara identificaram pistas abertas na reserva indígena usadas por garimpeiros. A estratégia dos hubs aéreos venezuelanos para driblar a fiscalização nacional foi denunciada pelas duas entidades ao Ministério Público Federal (MPF) de Roraima em agosto e setembro.
“Eles sabem quando os voos estão passando, para onde estão indo e conseguem perceber uma mudança no padrão dos voos”, explica Estevão Senra, pesquisador do ISA. “Os indígenas brasileiros também trocam informações com os yanomamis venezuelanos.”
Em território nacional, uma pista localizada na região do Alto Catrimani, norte de Roraima, foi identificada recentemente. “Foi uma estratégia que começou no final do primeiro semestre de 2023”, diz Senra. Em território venezuelano, uma pista maior foi identificada no Alto Orinoco. “Os garimpeiros estão intensificando as ações na cabeça do principal rio da Venezuela.”
“Os garimpeiros vão tentando se adaptar para burlar a fiscalização. Isso já ocorria, mas o Ibama detectou um aumento do fluxo aéreo para driblar o bloqueio dos rios”, afirmou Jair Schmitt, diretor de Proteção Ambiental do Ibama. “Percebemos pela movimentação das aeronaves e por informações de inteligência.”
Segundo Alisson Marugal, procurador do Ministério Público Federal em Roraima, o garimpo tem uma alta capacidade de reorganização. “O governo não tem uma estratégia adequada para essas situações e exigimos um novo plano que contemple o enfrentamento dessa nova estratégia do garimpo.”
Segundo o procurador, o governo, infelizmente, deixou de reformular o plano de desintrusão [retirada de garimpeiros] à luz dessas novas circunstâncias e por isso fomos à Justiça exigir um novo plano. Desde outubro, houve um arrefecimento preocupante [das operações], daí o retorno de garimpeiros, principalmente em áreas já desmatadas.
Como funcionam os hubs do garimpo
Aeronaves transportam maquinário, bombas para dragagem e alimentos. Os relatos e as imagens apontam que os aviões saem de pequenas pistas no território nacional carregadas de alimentos, equipamentos e até metais, como cassiterita. “Os aviões saem cedo, assim que amanhece, e vão até as pistas da fronteira. Lá, eles deixam os materiais e podem fazer viagens pelas proximidades para distribuí-los”, diz Senra.
Segundo Senra, não há um padrão nos fluxos aéreos. “O drible está em sair cedo, cruzar a fronteira e ficar mais tempo fora do alcance da fiscalização”, afirma.
Isso faz com que as aeronaves busquem pistas maiores abertas em território venezuelano, no Alto Orinoco. Nesses centros de distribuição, há uma redistribuição do peso em outras aeronaves.
Um dos principais centros de distribuição do garimpo ficava no Homoxi, em Roraima. Mas, em março do ano passado, a Polícia Federal desfez o acampamento dos garimpeiros. A operação destruiu também o maquinário utilizado. “Como eles ficaram sem essas pistas, deslocaram os centros de distribuição para a Venezuela. Esses hubs ajudam a dar escala ao garimpo.”
Segundo o procurador Marugal, os aviões costumam ficar em espécies de esconderijos, conhecidos como “mocós”. “É muito comum que, sendo perseguidos, as aeronaves cruzem a fronteira para fugir da FAB ou de outros órgãos de repressão”, diz ele.
Segundo Marugal, medidas como incursões regulares nos garimpos e fiscalização constante das pistas de pouso no entorno da terra indígena devem ser adotadas para impedir que a prática continue.
A Força Aérea Brasileira (FAB) informou que adota medidas específicas de controle de espaço aéreo. Segundo o órgão, desde 30 de janeiro do ano passado, está ativa a Zona de Identificação de Defesa Aérea (ZIDA) “buscando impedir os tráfegos aéreos suspeitos de ilícito, que, quando detectados, estão sujeitos às Medidas de Policiamento do Espaço Aéreo.”
Meios de detecção para voos são adotados. Além disso, a FAB afirma que são usadas aeronaves de Defesa Aérea sediadas em Boa Vista (RR) para a interceptação e identificação dos tráfegos aéreos não autorizados. O órgão atua junto à Polícia Federal.
É preciso intensificar a fiscalização nos aeródromos brasileiros, aumentar a fiscalização das pistas no território brasileiros para tentar surpreender as ações de garimpeiros.