A partir deste mês, tribunais de todo o país terão que seguir a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que criou uma política de paridade de gênero para o preenchimento de vagas para a segunda instância do Judiciário. O cumprimento da medida será monitorado pelo órgão e presidentes das cortes poderão responder a processos administrativos caso deixem de implementar o que prevê o texto.
A nova regra foi aprovada em setembro do ano passado durante a gestão de Rosa Weber, que se aposentou do Supremo Tribunal Federal (STF). A resolução estabelece que os tribunais deverão alternar entre uma lista exclusiva para mulheres e outra mista nas promoções pelo critério de merecimento.
Esse modelo de alternância das listas deve ser aplicado em todas as cortes que tiverem menos de 40% de mulheres, até que esse patamar mínimo seja alcançado. A medida vale para tribunais da Justiça Federal, Estadual e do Trabalho.
Pelo que ficou definido, a primeira lista de cada tribunal neste ano deverá ter como referência o gênero do último magistrado beneficiado. Por exemplo, se o último promovido foi um homem, agora a próxima vaga terá que ficar com uma mulher.
Na semana passada, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) publicou o primeiro edital para a promoção de juízes de carreira por merecimento seguindo a resolução e prevendo uma lista exclusiva de mulheres. As inscrições terminam nesta segunda-feira.
Durante a discussão da proposta, partiu do Conselho de Presidentes dos Tribunais de Justiça do Brasil (Consepre) a maior resistência em relação à medida. A entidade chegou a pedir que o CNJ retirasse o tema da pauta, para que a resolução não fosse aprovada. Em nota, disse se tratar de uma alteração “repentina e drástica”, que iria gerar “complicações à carreira da magistratura”.
Devido a esse tipo de postura, juízas de todo país que se mobilizaram pela aprovação da resolução, agora montaram um grupo para fiscalizar o cumprimento da medida, batizado de “Movimento Nacional pela Paridade”. Segundo a juíza Livia Borba, uma das coordenadoras do grupo, está comprovado que sem medidas específicas para corrigir as distorções que existem, a equidade de gênero não será alcançada.
Ela cita dados reunidos pelo CNJ sobre a participação feminina na magistratura que mostram que o percentual de juízas no Poder Judiciário é de 38% nacionalmente, mas que esse patamar não se repete na segunda instância. Atualmente, grande parte dos Tribunais de Justiça tem menos de 25% de mulheres entre os seus quadros. A corte do Amapá, por exemplo, não tem nenhuma magistrada entre os desembargadores.
“A paridade de gênero torna o Judiciário mais apto para cumprir suas funções constitucionais. É muito complicado um Judiciário formado só por homens brancos. Será que ele julga tão bem quanto se fosse formado por homens, mulheres, negros, com mais diversidade? Isso certamente tem um impacto, diz.
Ex-conselheira do CNJ, a desembargadora Salise Sanchotene foi a relatora da resolução e afirma que o órgão está preparado para monitorar a aplicação da nova norma. Segundo ela, se houver descumprimento, o primeiro passo, antes de uma eventual punição, é abrir um Pedido de Providências ou um Processo de Controle Administrativo para apurar o que aconteceu, se houve má-fé ou se a resolução não foi compreendida. “Pode se converter em processo disciplinar contra o presidente ou contra os membros do colegiado que descumprirem”, explica.
Em nota, o CNJ disse que orientou os tribunais sobre a implementação da resolução e que o eventual descumprimento da norma “pode ser apurado de ofício ou questionado a partir da instauração de pedido de providências”. Também afirmou que, para fazer esse acompanhamento, o Departamento de Tecnologia da Informação está desenvolvendo novas ferramentas, que devem ficar prontas em março.