Sábado é dia de moleza. Domingo também é dia de moleza. Se fosse por vontade dela, a moleza ficava-nos com os sete dias da semana.
Acordar mole, toda a gente do mundo acorda. Mas só os portugueses se sentem mal se não o confessarem: “Estou mole!” Os ingleses acordam listless – sem desejos e não sem listas – mas vê-se logo pelo sufixo – less, que é uma sensação negativa. Falta qualquer coisa, mas a coisa que falta não é má. É boa: é a vontade de fazer seja o que for que falta. Já o português sente orgulho em anunciar: “Estou mole! Não me apetece fazer nada!” Apetece-nos entregar-lhe logo um ramo de flores.
A moleza é a melhor maneira de explicar aos estrangeiros a diferença entre ser e estar. Ser mole é uma maneira de ser, um destino, uma condição. Há quem seja e há quem não seja. Não há nada a fazer.
Mas estar mole é um milagre que acontece aos mais irrequietos. São umas férias que se desprendem da almofada. Quando alguém acorda e diz “Estou mole!”, a palavra que falta ali é “Finalmente!” Ou “Iupii! Afinal sou humano!”.
Ser mole é negativo, até porque sendo mole todo o tempo, não se faz ideia do prazer de estar mole, de vez em quando. Por isso é tão bonita a palavra “espreguiçar”. É um prazer com letra grande, deixarmo-nos levar pelo esticão, como se os braços quisessem vir-se, e nós deixássemos que puxassem por nós. Dizer “estou mole!” enquanto nos espreguiçamos solta aquela faísca de culpabilidade e volúpia que associamos à malandrice.
Só se acorda mole quando se dormiu bem: quando a moleza não faz sentido. É uma recompensa dupla: dormiu-se bem, mas não se está com vontade de fazer nada. Os ingleses, por exemplo, são mais moles e mandriões do que os portugueses. Por isso é que não percebem a nossa moleza.
A nossa moleza é a moleza de quem trabalha, é a moleza de quem se deita cansado, é a moleza de quem devia levantar-se. Vê-se também, pelo que acabo de dizer, que é a moleza da lata, do parlapié, e do “sabes muito…!”
(Transcrito do PÚBLICO)