Os óculos de lente vermelha da pequena Eduarda Maciel, de 8 anos, não são apenas parte de um estilo. Duda tem acromatopsia, uma doença congênita cujo principal sintoma é a incapacidade de distinguir cores. A condição é rara, afeta em média uma pessoa a cada 30 mil.
Duda só enxerga branco, preto e tonalidades de cinza. Ela também tem fotofobia (alta sensibilidade à luz), baixa visão e não consegue ver a profundidade das coisas.
“Nosso olho tem células receptoras de luz, os cones. Nas pessoas com acromatopsia, eles funcionam mal ou, até mesmo, não existem”, explica o oftalmologista Vinicius Kniggendorf, especialista em retina no Hospital Oftalmológico de Brasília (HOB). “A falta deles dificulta a capacidade de distinguir objetos e pessoas”, completa.
No caso de Duda, as dificuldades começaram a aparecer nos primeiros dias de vida. Quando ela tinha cerca de dois meses, os olhinhos começaram a mexer involuntariamente, como se fossem incapazes de se fixar em algo.
“Isso começou em uma sexta-feira. Na segunda, já falei com o pediatra sobre o sintoma. O médico me encaminhou direto para o neurologista”, lembra a mãe, Letícia Maciel. A família vive em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.
Aquele era o início de uma jornada de muitas incertezas e diagnósticos incompletos. De uma neurologista, Letícia chegou a ouvir palavras capacitistas, que sugeriram que a filha tinha autismo ou alguma outro problema neurológico.
“Vi que a médica estava muito preocupada com o fato de minha filha ficar olhando para a própria mão. A Duda deveria ter uns seis meses na época e ela me perguntou se eu tinha medo de ter uma filha abobada”, lembra a mãe.
Eduarda nunca teve nenhum problema neurológico, mas isso não facilitou o diagnóstico. Os três primeiros oftalmologistas que a família procurou não conseguiram identificar nenhum problema na visão da criança que justificasse os sinais observados pela mãe.
A pergunta que levou à resposta
A resposta final veio de uma observação de Letícia. A menina já tinha um ano e seis meses e demonstrava uma ótima memória para se lembrar do nome de pessoas e de formas geométricas. As cores, entretanto, ela não conseguia aprender de jeito nenhum.
Após o relato da mãe, a médica que estava atendendo à menina – uma oftalmologista especializada em crianças – começou a suspeitar de acromatopsia. Saindo dali, a mãe pesquisou pela primeira vez sobre a condição e ficou chocada com a descrição perfeita do quadro de Duda. O diagnóstico foi confirmado em exames mais precisos realizados em São Paulo.
Óculos mágicos
Letícia começou a buscar informações na internet sobre a doença, mas elas eram raras. Nas redes sociais, conseguiu encontrar uma outra mãe que vivia em Campo Bom, uma cidade próxima, e tinha um filho com acromatopsia.
O menino usava um óculos de lente especial alaranjada que mudava de cor ao ser exposto ao sol. “Os óculos não são uma cura definitiva para a acromatopsia, mas são capazes de reduzir a sensibilidade à luz e aumentam o contraste, ajudando os usuários a diferenciar os tons de cinza que podem ser vistos”, indica Kniggendorf.
“A primeira vez que ela usou foi em uma praça, um óculos emprestado ainda, mas era visível a expressão de espanto dela com aquela nova capacidade desbloqueada”, lembra a mãe. Em uma nova consulta com a oftalmo, a mãe conseguiu uma recomendação para a filha usá-los. Duda já tinha 3 anos.
Os óculos permitiram que Duda ganhasse autonomia, conseguindo se locomover com mais segurança e sendo capaz de ver o mundo ao seu redor com mais definição. Ainda há, porém, algumas desafios a serem enfrentados
“Quando ela muda de escola ou vai para um novo ambiente, eu sempre a acompanho e indico onde há degraus ou mudanças de altura, já que ela não enxerga isso bem. Tem coisas que ela não consegue fazer: um dos sonhos dela é conseguir jogar frescobol, mas não dá. No fim das contas, porém, aprendi que a história da minha filha não é de limitações, mas de potências”, conclui a mãe.
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