Seis anos e dez dias depois do crime que chocou o mundo, duas perguntas continuam sem respostas. Quem mandou que os mandantes do crime encomendassem a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ)? E quem mandou que o então chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro travasse as investigações sobre o crime?
Crime perfeito não há, a não ser nos clássicos da literatura. Existe investigação mal feita, de propósito ou não. Mas se existisse crime perfeito, o fuzilamento de Marielle e do seu motorista Anderson Gomes poderia ter aspirado a tal condição até ontem. É o que sugerem os fatos conhecidos até aqui, embora incompletos.
Foram dois matadores profissionais os executores do crime – o ex-policial militar Elcio Queiroz, que dirigia o carro que perseguiu o carro de Marielle pelo centro do Rio, e Ronnie Lessa, também ex-policial militar, que de dentro do carro pilotado por Queiroz atirou na vereadora, matando-a na hora, e também o motorista Gomes.
Foram dois políticos de alto prestígio na sociedade carioca que encomendaram o crime a Lessa– ambos com livre trânsito na Assembleia Legislativa do Estado e no Tribunal de Contas da União: os irmãos Brazão – Chiquinho, deputado federal pelo União-Brasil, e Domingos, conselheiro do tribunal, eleitores de Bolsonaro. Falta algum nome?
E foi um delegado, Rivaldo Barbosa, nomeado chefe da Polícia Civil do Rio às vésperas do assassinato de Marielle, que garantiu aos interessados no sucesso do crime que ele jamais seria desvendado. Barbosa funcionou como uma espécie de consultor dos matadores, orientando-os para que fizessem o melhor trabalho possível.
Por exemplo: foi de Barbosa o conselho para que Marielle não fosse morta na saída da Câmara dos Vereadores, segundo contou Lessa em delação à Polícia Federal; pois se fosse, o crime seria mais facilmente caracterizado como “crime político”, e caberia à Polícia Federal investigá-lo. Barbosa ganhou 400 mil reais pela consultoria.
Mas não só. Ganhou também a confiança da família e de amigos de Marielle. Foi o primeiro a saber do crime pelo então deputado Marcelo Freixo (PSOL), lamentando muito. Fez questão de ir ao enterro de Marielle. Abraçou a mãe, a irmã e a viúva da vereadora, emocionando-se ao pé do caixão que guardava o corpo.
A melhor maneira encontrada por Barbosa para blindar a apuração do crime foi a troca de delegados que comandaram o inquérito. Foram pelo menos cinco delegados em seis anos e pouco. Um deles, Giniton Lages, o primeiro, escreveu o livro “Quem matou Marielle?”, lançado em 2022, no qual diz que “se apaixonou” pela atuação da vereadora.
Alvo de busca e apreensão “por “atrapalhar” as investigações, Lages acabou afastado da Polícia Civil por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, e será obrigado a usar tornozeleira eletrônica. Outro nas mesmas condições e por igual motivo: Marco de Barros Pinto, comissário de polícia.
Teve início por toda parte o esforço coletivo de apagar as comprometedoras impressões digitais deixadas pelos mais ilustres recém-chegados ao sistema prisional brasileiro. Citado há meses como um dos mandantes da morte, Chiquinho Brazão era secretário especial do prefeito Eduardo Paes (PSD), do Rio
Demitiu-se. Em reunião extraordinária no domingo (24), o União-Brasil expulsou Chiquinho dos seus quadros. A Câmara dos Deputados tem poderes para anular a decisão de Moraes de prender Chiquinho, mandando soltá-lo. Terá coragem de o fazer? Suportará tamanho desgaste em sua imagem?
Marielle foi morta porque defendia, contra interesses do clã Brazão, a ocupação social de uma área na Zona Oeste do Rio reivindicada por milicianos para incorporação imobiliária.
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