Crise do oxigênio no Amazonas que matou pacientes na pandemia de Covid-19 por asfixia completou três anos no domingo

AMAZONAS

Nesta semana, no dia 14 de janeiro, completaram três anos do caos que se instalou no sistema de saúde de Manaus, em 2021, com a falta de oxigênio nos hospitais superlotados com recordes de internações por Covid-19. O estoque de oxigênio acabou em várias unidades de saúde da cidade, levando pacientes internados à morte por asfixia.

Investigações ainda em andamento dos órgãos de controle apontam que mais de 60 pessoas morreram no Estado por conta da falta de oxigênio. Mais de 500 pacientes foram transferidos às pressas para hospitais de outros estados. O problema ganhou as capas de jornais e teve repercussão internacional. Embora o auge da crise tenha ocorrido em janeiro, dados epidemiológicos da covid-19 no Amazonas já mostravam um aumento exponencial de casos da doença e de mortes um mês antes.

O problema atingiu o ápice em 14 de janeiro de 2021, quando o sistema de saúde entrou em colapso. Naquele dia, o consumo de oxigênio dobrou em relação à primeira onda da covid-19. Pacientes que precisavam de leitos não conseguiam vagas e aqueles que já estavam internados não tinham atendimento adequado. Imagens com pedidos de ajuda por profissionais de saúde viralizaram. “Acabou o oxigênio de toda uma unidade de saúde. Tem muita gente morrendo! Pelo amor de Deus!”, disse uma psicóloga em um vídeo gravado em frente de um pronto-socorro. Em outra unidade, uma mulher dizia que o hospital estava dividindo cilindros de oxigênio para manter os pacientes vivos.

Já em dezembro de 2020, o Amazonas sofreu o aumento de novos casos de Covid. Com o consequente aumento de internações e mortes, o governo estadual determinou o fechamento total do comércio no dia 26 de dezembro.

A medida causou revolta nos comerciantes e manifestações por toda a capital. Sob pressão, o governo flexibilizou a abertura do comércio no fim do ano, mas a Justiça determinou o retorno das medidas restritivas no começo de janeiro. Em meio a esse cenário, foi identificada no Amazonas a variante P.1, hoje conhecida como Gama, que se mostrou mais letal e mais transmissível.

Na ocasião, o governador do Amazonas, Wilson Lima, descreveu a situação como dramática, por conta da demanda crescente do estado. O então presidente da República Jair Bolsonaro (PL) disse que não era atribuição do governo federal levar oxigênio para o Amazonas. Segundo a Procuradoria Geral da República (PGR), um relatório apontou que o Ministério da Saúde foi informado no dia 8 de janeiro sobre a iminente falta de oxigênio pela empresa White Martins.

Apesar disso, o então titular da pasta, Eduardo Pazuello, agiu tardiamente para enfrentar o problema. Naquela época, a pasta se dedicava propagar o uso de medicamentos ineficazes no combate à doença, como a hidroxicloroquina.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, instalada no Senado, mostrou que uma carta foi enviada pela White Martins ao governo do Amazonas no dia 16 de julho de 2020, indicando que o estoque de oxigênio fornecido pela empresa ao estado não suportaria um colapso na saúde pública, justamente o que aconteceria em janeiro de 2021.

O relatório final da CPI da Pandemia pediu o indiciamento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e da secretária Mayra Pinheiro, da mesma pasta. A comissão ainda pediu o indiciamento do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), por crime de responsabilidade e epidemia com resultado de morte. O ex-secretário de Saúde do estado Marcellus Campêlo foi acusado de prevaricação. A defesa do governador argumenta que ele só poderia ser investigado pela Assembleia Legislativa do Estado.

O ex-secretário Marcellus Campêlo disse que seu nome não aparecia na lista original de pedidos de indiciamento da CPI e foi incluído posteriormente por “imposição de cunho eleitoral”. “Tenho consciência do trabalho realizado para salvar vidas, junto com os milhares de servidores da Saúde e reafirmo disposição em sempre colaborar com a Justiça, para que a verdade prevaleça”, afirmou.

Sentença

Em dezembro de 2023, a Justiça Federal sentencio o Estado do Amazonas e o município de Manaus a indenizarem em R$ 1,4 milhão uma família de vítima fatal da Covid-19, cujo quadro foi comprovadamente agravado pela falta de oxigênio no Amazonas, que aconteceu em janeiro de 2021.

Os seis filhos e o viúvo da vítima, Leoneth Cavalcante de Santiago, devem receber R$ 200 mil cada por responsabilidade civil e ato ilícito cumulado por danos morais. A medida cabe recurso por parte dos sentenciados.

De acordo com a sentença, Leoneth deu entrada no hospital Platão Araújo, em Manaus, no dia quatro de janeiro de 2021. Ela tinha sintomas de Covid-19 e foi diagnosticada com “estado crítico” da doença logo em seguida.

Onze dias depois, Leonath morreu “em decorrência da demora no atendimento médico adequado, bem como asfixia em razão da falta de oxigênio no estado do Amazonas”, afirma Salles.

No laudo médico, consta “síndrome respiratória aguda grave” e “Covid-19”. O hospital em que ela estava, assim como os outros da região, não tinha oxigênio e nem Unidade Intensiva de Tratamento (UTI) disponíveis para tratá-la adequadamente.

A sentença considerou o descumprimento do dever constitucional de assegurar o direito à saúde, descrito no Art.196 da Constituição Federal, pela falta de condições adequadas para o tratamento de Leoneth.

Também mencionou, como justificativa para a sentença, o fato de que a paciente se manteve em quadro estável de saúde enquanto ainda havia oxigênio disponível na unidade de saúde em que estava, um indício de que a culpa da morte seria, de fato, a falta de equipamento.

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