Em carta a Lula, servidores da Abin pedem novo marco regulatório e distância de políticos

AMAZONAS

A União dos Profissionais de Inteligência de Estado da Abin (Intelis) encaminhou na noite de quarta-feira (31) uma carta ao presidente Lula (PT). A entidade pede uma reforma do sistema de inteligência brasileiro e um novo marco normativo para a função.

“O momento atual parece ter convencido a todos sobre o que já defendemos há anos: a Inteligência precisa ser reformada. Precisamos definir, na lei, nossas atribuições e ferramentas de trabalho. Não há agência de Inteligência que não execute ações sigilosas. A busca do dado negado e sua posterior análise, além da proteção dos ativos informacionais do país, compõem o cerne de nossa atividade. Porém, não podemos prescindir de controle efetivo”, diz a carta.

Os servidores pedem ainda “a criação de uma vara especial na Justiça” e um “controle ativo por parte do Congresso” e criticam o que consideram “reiteradas nomeações de pessoas que não possuem experiência na prática de Inteligência Nacional para posição de direção fragilizam a atividade”. “Para isso, também é necessário que a atividade seja conduzida por quem conhece seus meandros”, afirmam.

Nesse sentido, reiteram serem servidores de estado que precisam manter distância de políticos.

“As servidoras e servidores da Abin são discretos por dever de ofício. Um dos maiores dilemas enfrentados pelas agências de Inteligência de todo o mundo é justamente como dosar a proximidade entre seus dirigentes e os políticos a quem assessoram. A distância precisa ser na justa medida que permita a compreensão dos objetivos traçados para produzir uma assessoria efetiva, mas previna distorções de análise e de finalidade em prol de agendas políticas pessoais, como ocorreu em gestão passada. Somos servidores do Estado”.

A seguir, a íntegra da carta:

“Brasília, 31 de janeiro de 2024

Excelentíssimo Sr. Presidente Luiz Inácio Lula da Silva

As servidoras e servidores da Abin são discretos por dever de ofício. Um dos maiores dilemas enfrentados pelas agências de Inteligência de todo o mundo é justamente como dosar a proximidade entre seus dirigentes e os políticos a quem assessoram. A distância precisa ser na justa medida que permita a compreensão dos objetivos traçados para produzir uma assessoria efetiva, mas previna distorções de análise e de finalidade em prol de agendas políticas pessoais, como ocorreu em gestão passada.

Somos servidores do Estado.

O cuidado com que sempre lidamos com esse dilema fez com que não procurássemos nos aproximar do meio político por outras vias. Só contamos com o nosso trabalho para prestar contas e a maior parte dele tem caráter sigiloso.

Parte do nosso trabalho, porém, veio a público por meio da Lei de Acesso e da CPMI dos Atos Antidemocráticos de 8 de janeiro. As centenas de relatórios sobre a pandemia de Covid-19 elaborados por nossas servidoras e servidores foram tornados públicos e mostraram nosso compromisso com o método científico e com a verdade, ainda que desagradasse os tomadores de decisão na ocasião.

O relatório final da CPMI dos Atos democráticos constatou o que já sabíamos: nossos quadros têm compromisso inabalável com o Estado Democrático de Direito – cumprimos com nossa atribuição de informar, previamente, às autoridades de segurança sobre os riscos que nossa democracia corria. Esta não foi a única oportunidade em que reafirmamos esse compromisso.

Em julho de 2022, quando o processo eleitoral brasileiro era atacado pela mais alta autoridade do país, a INTELIS tornou pública sua defesa às instituições brasileiras e à democracia. Não tivemos medo de defender o regime que nos permitiu trabalhar na Atividade de Inteligência.

Somos civis, lutamos para que a Atividade fosse realocada para um ministério civil, ingressamos na Abin por concurso público e temos mulheres e homens preparados para dirigir a Agência à qual dedicamos toda uma vida.

Nosso corpo funcional é plural, graças aos concursos públicos e às políticas afirmativas, e essa diversidade nos protege de vieses hegemônicos e do pensamento único. Não há Inteligência quando todos pensam igual e o pensamento vem em forma de ordem hierárquica. O nosso método de trabalho e a nossa diversidade resultam na produção de conhecimentos isentos e republicanos.

O momento atual parece ter convencido a todos sobre o que já defendemos há anos: a Inteligência precisa ser reformada. Precisamos definir, na lei, nossas atribuições e ferramentas de trabalho. Não há agência de Inteligência que não execute ações sigilosas. A busca do dado negado e sua posterior análise, além da proteção dos ativos informacionais do País, compõem o cerne de nossa Atividade. Porém, não podemos prescindir de controle efetivo.

Defendemos a criação de uma vara especial na Justiça. Ansiamos por controle ativo por parte do Congresso. Nossas servidoras e servidores precisam trabalhar com apropriada segurança jurídica. A sociedade brasileira precisa proteger a Atividade de Inteligência de quem a utiliza como instrumento político-partidário.

Para isso, também é necessário que a Atividade seja conduzida por quem conhece seus meandros. As reiteradas nomeações de pessoas que não possuem experiência na prática de Inteligência Nacional para posição de direção fragilizam a Atividade.

O Brasil precisa de um novo marco normativo para a Atividade de Inteligência! Estamos aqui para ajudar nessa travessia, Presidente. Dedicamos anos das nossas vidas à Atividade, somos os brasileiros e as brasileiras certos para contribuir nesse desafio. A Inteligência precisa se profissionalizar e o único caminho para isso é valorizar seus profissionais. Precisamos da Inteligência para construirmos um País ativo no cenário internacional. Precisamos da Contrainteligência para que nosso Estado se mantenha altivo e soberano. A democracia não pode prescindir de uma agência de Inteligência republicana e eficaz. Estamos, como sempre estivemos, à disposição!

INTELIS | União dos Profissionais de Inteligência de Estado da ABIN”

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