Além de corrupção ativa e organização criminosa, os sócios e representantes da Murano Construções LTDA foram denunciados 38 vezes por lavagem de dinheiro e 62 vezes por peculato. Alvos de uma operação do Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o governo do Acre, os donos da empresa, com sede no Guará, receberam mais de R$ 148 milhões do governo federal por conta de obras e contratos em todo o país.
Mesmo denunciada por corrupção, a Murano segue recebendo pagamentos de contratos com governo federal. Desde 28 de novembro, quando foi oficialmente acusada, o empreendimento fez 214 negócios com órgãos públicos por meio da modalidade aplicação direta.
Denúncia no Acre
De acordo com as investigações da PGR, a construtora do Distrito Federal e outras empresas subcontratadas por ela teriam pagado propina ao governador do Acre, Gladson Cameli, em valores que superam os R$ 6,1 milhões, por meio da quitação de parcelas de um apartamento em bairro nobre de São Paulo e de um carro de luxo.
A denúncia foi apresentada ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) no fim de novembro. Além do governador, foram denunciados a mulher de Cameli, dois irmãos do chefe do Poder Executivo acriano, servidores públicos, empresários do DF e pessoas que teriam atuado como “laranjas” no esquema. A estimativa é que os prejuízos aos cofres públicos alcancem quase R$ 150 milhões.
No Acre, a Murano foi contratada graças a um mecanismo chamado “adesão à ata”, quando um órgão contrata empresa aproveitando licitação realizada por outra instituição pública. Nesse caso, a licitação foi feita pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano (IFG), campus Ceres, para a prestação de “serviços comuns de engenharia referentes à manutenção predial”.
A empresa venceu a ata de registro de preço, e a Secretaria de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano do Estado do Acre aderiu à ata, contratando a empresa em questão para executar obras rodoviárias. Ela, no entanto, não executava o serviço, e subcontratou outras firmas, uma delas que tem como sócio um irmão do governador.
Segundo a denúncia, “aproximadamente dois terços do valor pago correspondem a objeto totalmente estranho ao contratado, em claro desvirtuamento do princípio da isonomia”.
Além disso, análises técnicas da Controladoria-Geral da União (CGU) incluídas na denúncia apontam suspeita de sobrepreço de R$ 8,8 milhões e de superfaturamento de R$ 2,9 milhões.
O MPF pede que o governador responda por dispensa indevida de licitação, peculato, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O órgão ainda solicita o bloqueio de bens dos denunciados até o valor de R$ 12 milhões.
Licitações e contratos
Considerada uma das principais construtoras no país, a Murano firmou milhares de contratos e processos licitatórios com o governo federal em diversos estados. Segundo o Portal da Transparência, a empresa já recebeu R$ 148.698.217,06 dos cofres públicos nos últimos anos.
Outras investigações
No início do ano passado, a Murano chegou a ser alvo de um inquérito da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) por corrupção em contratos. No entanto, houve uma decisão judicial que arquivou as operações, após verificar que foram esgotadas as linhas de investigação sem que se colhesse elementos para justificar uma ação penal.
Recentemente, a Murano Construções passou por um processo de rescisão de contrato com a Fundação Zoológico de Brasília. Consta que a revogação foi justificada pelos artigos 77 e 78 da Lei nº 8.666/93. A norma aponta que a inexecução total ou parcial do contrato enseja a sua anulação, com as consequências contratuais e as previstas em lei ou regulamento.
No sistema do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT), a empresa também aparece envolvida em outras atividades analisadas, principalmente por conta de licitações antigas com o Zoológico. Todas foram arquivadas.
Defesa
Questionado pelo Metrópoles sobre o suposto favorecimento, a defesa do governador Gladson Camelli enviou nota. Leia:
“Esse pedido de afastamento é arbitrário e absurdo. Não há nenhum fato novo que justifique esse pedido de afastamento. Ele decorre de um outro pedido que já tinha sido indeferido pelo Superior Tribunal de Justiça. É além de tudo, ele foi feito na vagância do cargo de procurador-geral da República.
Essa investigação é toda ilegal. Ela decorre de uma devassa realizada pela Polícia Federal de Cruzeiro do Sul, sem que tivesse competência para investigar o governador Gladson Cameli. Para se ter uma ideia, quebraram o sigilo de uma criança de apenas sete anos de idade, o filho do governador.
É não há nenhuma ilegalidade atribuível ao governador Gladson Cameli. As obras foram todas executadas e entregues ao povo do Acre, que reelegeu Gladson Cameli no primeiro turno. Esse pedido de afastamento é uma afronta ao mandato conferido pelo povo do Acre.
O governador Gladson Cameli confia no Poder Judiciário, Superior Tribunal de Justiça e fará sua defesa e tem a convicção que esse pedido ao final será indeferido.”
O Metrópoles tentou contato com a Murano Construções LTDA. Não houve resposta até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto para possíveis manifestações.