Investigada por desvio de dinheiro, a Organização Social Civil (OSC) Salve a Si enfrenta novas acusações com os gestores atuais. Denúncias de ex-funcionários apontam que a cúpula da instituição teria orientado a racionar os medicamentos para cortar custos e manter a reserva de remédios da ONG. O Ministério Público de Goiás (MPGO) confirmou que investiga a redução dos insumos, mas que não pode fornecer informações porque está sob sigilo.
Em 5 de março, o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura – órgão autônomo vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania – inspecionou a comunidade terapêutica e está elaborando um relatório sobre a visita.
“Uma série de violações”, disse o deputado federal pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ), que foi convidado a participar da fiscalização pelo órgão do governo federal.
As denúncias dos ex-funcionários apresentam troca de mensagens da equipe responsável pela administração dos medicamentos. Em uma das conversas, na qual o Metrópoles teve acesso, a profissional Camilla Bezerra, responsável pela sala de remédios, e a esposa do atual presidente da Salve a Si, Rafael Barnabé, orienta que os demais funcionários controlem o remédio em grupos dos colaboradores.
“Não vamos conseguir manter nossa reserva assim. Reduzam a quantidade ao máximo”, afirma Camilla em uma das mensagens. Ela orienta ministrar apenas 15ml de dipirona e que parem com a administração de paracetamol e nimesulida. “Quem reclamar de dor, chame o familiar”.
Camilla é formada em medicina na Bolívia e, até o momento, não foi aprovada em provas de habilitação para exercer a medicina no Brasil. Ela tem uma empresa com o nome Twinflame Terapia Holística e Cristais e, por isso, algumas mensagens foram trocadas com a nomenclatura do empreendimento. Veja as mensagens:
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“Isso é cruel demais”, disse uma denunciante. “Essas pessoas já não têm apoio e, quando conseguem pedir ajuda, acontece isso”, concluiu.
O Metrópoles também teve acesso a uma carta de um acolhido, que conta a um familiar que a medicação dele foi retirada pela instituição. Ele tem vício em cocaína e tinha o acompanhamento de psiquiatra com a recomendação de quatro doses diárias, mas teria recebido apenas duas.
A reportagem conversou por 22 minutos com o advogado da Salve a Si na quinta-feira (14/3), que não soube responder sobre as mensagens dos gestores da casa pedindo a redução, mas alegou que as denúncias fazem parte de um complô das pessoas que administravam a Organização Social Civil para derrubar a atual gestão e voltar a administrar.
Em nome da instituição, ele informou que responderia esse e outros questionamentos em uma nota, que não foi enviada até a última atualização desse texto.
Irregularidades
Em agosto de 2023, o Conselho de Política Sobre Drogas do Distrito Federal (Conen-DF) apontou irregularidades na administração de medicamentos e sala de medicação, irregularidades trabalhistas, precariedade no atendimento, irregularidades nos Planos de Atendimento Singular e violações de direitos.
As informações constam no relatório do Grupo de Trabalho composto por pessoas da sociedade civil, da Secretaria de Saúde e do Conselho de Psicologia. O grupo foi formado para fiscalizar irregularidades após a suspensão de financiamento público.
Antes de ser denunciada por desvio de dinheiro, a Salve a Si contava com três convênios: do Governo do Distrito Federal, da União e do Governo de Goiás. Atualmente, o instituto conta apenas com repasses do governo goiano.
Desvio de dinheiro
O Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) determinou no último dia 9/8, a inspeção in-loco do corpo técnico da Corte na Organização da Sociedade Civil (OSC) Salve a Si e em sua filial, a Casa Maria de Magdala, além da suspensão imediata dos repasses de recursos públicos à entidade. A soma chega a R$ 2,75 milhões.
O TCDF analisa uma representação sobre suposto uso indevido de verbas públicas repassadas à Salve a Si.
As possíveis irregularidades englobam desvio de finalidade na utilização de recursos públicos, erros substanciais na execução das atividades objeto da parceria e deficiências associadas à transparência tanto na gestão dos recursos, quanto na prestação do serviço.
O Metrópoles questionou a instituição sobre as denúncias, que informou que responderia em nota, mas até a última atualização do texto não foi enviada. O espaço segue aberto para possíveis manifestações.
A reportagem também procurou por Camilla Bezerra por contatos em telefone, mensagens de WhatsApp e até mesmo por meio de familiares, mas não teve resposta dos questionamentos.