São Paulo – O governo federal articulou a aprovação de um projeto de lei no Congresso que atendeu interesses de uma entidade presidida por Marcio Toledo, marido de Marta Suplicy, paralelamente às negociações entre a ex-prefeita de São Paulo e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que ela retornasse ao PT e disputasse as eleições da capital neste ano ao lado de Guilherme Boulos (PSol).
Toledo tem empresas no setor de infraestrutura e energia e, em setembro passado, criou com outros empresários a Associação Brasileira de Armazenamento de Energia (Armazene), entidade encarregada do lobby do setor junto ao poder público.
Uma das pautas do setor era a aprovação de um projeto de lei, apresentado no segundo semestre de 2020 pelo deputado João Maia (PP-RN), que permitia que empresas privadas detentoras de contratos com o setor público pudessem emitir debêntures (títulos de dívidas) para financiar seus investimentos.
A pauta era suprapartidária e tinha coassinatura de parlamentares que iam do PT ao PL. O texto havia sido aprovado na Câmara ainda em 2022, mas só no fim de setembro foi votado no Senado – e retornou à Câmara com emendas.
Negociações em paralelo
Toledo esteve em Brasília no fim de novembro com outros representantes da Armazene para um congresso do setor de energia. Na ocasião, se reuniu como representante do setor com o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, segundo o site da entidade. O encontro não estava na agenda do ministro.
Naquela ocasião, contudo, segundo membros do PT, ele já havia sido informado sobre o interesse de Lula por Marta, e o casal já havia iniciado as conversas com os petistas, em paralelo ao trabalho de Toledo com as empresas de energia.
O texto das debêntures entrou na pauta de votações da Câmara duas semanas depois do encontro com Padilha. O relator do projeto foi o deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP).
Além de empresário e deputado federal, Jardim é também o presidente do conselho consultivo da Armazene.
Durante a votação do texto na Câmara, Jardim fez questão de agradecer publicamente, no microfone do plenário, ao líder do Governo na Casa, José Guimarães (PT-CE), que “pessoalmente diligenciou para que a matéria pudesse vir a plenário”.
Dois dias depois da aprovação final do texto, Marta deixou a Prefeitura de São Paulo, alegando férias. Na época, embora uma série de notícias sobre seu retorno ao PT já circulasse na imprensa, ela não havia conversado sobre o tema com o prefeito Ricardo Nunes (MDB), de quem era secretária de Relações Internacionais.
Acordo fechado
Lula recebeu Marta e Toledo em seu gabinete na segunda-feira (8/1), quando fecharam o acordo sobre o retorno dela ao PT. O grupo posou junto para fotos ao lado do deputado federal Rui Falcão (PT-SP), que participou do diálogo para a mudança de partido. Dois dias depois, o presidente sancionou o projeto de lei das debêntures.
Na Prefeitura, aliados de Nunes – que não esconde a mágoa de Marta por ter sido trocado por Boulos e o PT – afirmam, reservadamente, que a aprovação do projeto das debêntures foi uma das “moedas de troca” oferecidas ao casal Marta e Toledo para a mudança de lado da ex-prefeita.
O Metrópoles procurou Toledo para comentar o caso por meio da assessoria de imprensa de Marta, que não enviou nenhuma resposta.
Incentivos bilionários
Segundo o site da própria Armazene, a nova lei deve injetar recursos da ordem de R$ 200 bilhões somente no setor de energia.
Outros setores da economia, contudo, também defendiam a aprovação da proposta. Durante a tramitação no Senado, o relator do projeto na Casa, Rogério Carvalho (PT-SE), estimou que a norma poderia alavancar R$ 1 trilhão em investimentos no país.
O PSol, partido de Boulos, foi contrário ao texto final, diante da constatação de que empresas que detiverem contratos de concessão de escolas, presídios e hospitais também possam aproveitar o novo benefício.
O projeto autoriza que empresas que detêm contratos de concessão com o poder público ou participem de Parcerias Público-Privadas (PPPs) possam emitir debêntures (títulos de dívida) ao mercado para financiar seus projetos, e que esses títulos possam ser adquiridos também por fundos de pensão.
Além disso, o texto prevê incentivos tributários para as empresas que financiam projetos de infraestrutura e emitem os títulos. A nova lei ainda precisa de um decreto de regulamentação.