Hoje é dia de pesquisas. Hoje, amanhã e nos próximos sete meses. Em ano de eleição, você deixa de lado que há três tipos de mentiras: as mentiras, as mentiras deslavadas e as estatísticas. A frase foi atribuída ao primeiro-ministro britânico Benjamin Disraeli pelo escritor americano Mark Twain.
As pesquisas eleitorais já mentiram mais. Mas elas ainda podem errar, apesar de a margem ser pequena. Erram porque o eleitor tem o direito de mentir para o pesquisador. Veja-se o caso dessa pesquisa de hoje do Datafolha, segundo a qual 63% dos eleitores paulistanos não votariam de jeito nenhum em um candidato apoiado por Jair Bolsonaro.
Acho um número inflado ou Ricardo Nunes, atual prefeito de São Paulo, não teria corrido atrás do apoio do ex-presidente da República. Se não, vejamos. Na última eleição presidencial, Jair Bolsonaro perdeu para Lula na capital paulista. Obteve 46% dos votos válidos contra 54% de Lula. Tendo a crer que esses 54% expressam hoje a rejeição máxima a um candidato apoiado por Jair Bolsonaro.
O número de Lula no Datafolha parece mais crível: 42% não votariam de jeito nenhum em um candidato apoiado pelo petista.
Alguém poderia dizer: de lá para cá, a imagem de Jair Bolsonaro erodiu-se e mais gente sente aversão a ele. Se esse for o caso, a aversão parece estar diminuindo. Na pesquisa feita pelo Datafolha em agosto do ano passado, 68% dos paulistanos disseram que passariam longe de um aliado de Jair Bolsonaro para a prefeitura de São Paulo. Já a rejeição a um candidato do lulismo aumentou de 37% para os atuais 42%.
Não é improvável que, até outubro, o movimento se mantenha e a ojeriza a Jair Bolsonaro encolha. Se assim for, Lula deveria ficar preocupado porque, repito, o eleitor tem o direito de mentir para o pesquisador. Muita gente talvez ache que expressar simpatia pelo ex-presidente signifique compactuar com o crime, dada a permanente demonização dele. Na cabine de votação, contudo, quem sabe esse mesmo pessoal se sinta seguro para votar em um candidato chancelado por Jair Bolsonaro. Ou seja, a rejeição ao ex-presidente seria ainda mais baixa do que indicam as pesquisas.
Há outro ponto: a estratégia de Lula é nacionalizar — ou ideologizar — a máximo a eleição em São Paulo, com Guilherme Boulos concorrendo contra um nome de Jair Bolsonaro; a de Ricardo Nunes, para reeleger-se, é fazer com que a eleição municipal continue a girar em torno do cardápio de sempre: saúde, educação, trânsito e buraco na rua. Tudo isso com uma pitada de direita contra esquerda para enfatizar o radicalismo de Guilherme Boulos. Neste momento, ambos estão empatados tecnicamente, segundo o Datafolha.
A estratégia de Lula é arriscada, não só porque a rejeição a ele aumentou e a de Jair Bolsonaro diminuiu (outra vez, podendo ser bem menor do que mostra o Datafolha), mas porque Guilherme Boulos, com fama de radical, tem 34% de rejeição total dos paulistanos contra 26% de Ricardo Nunes, que tem fama de moderado. Se esses números forem os reais, a nacionalização tenderia a reforçar os poréns ideológicos do eleitorado ao candidato do petismo.